‘Aqueles que estavam aqui antes dos outros’

Último 19 de abril marca a mudança de nome “Dia do Índio” para “Dia dos Povos Indígenas”, e levanta discussões importantes
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04/05/2023 - 09:24 - atualizado em 04/05/2023 - 09:30

Por Isadora Mendes

2023 entrou para a história com o primeiro “Dia dos Povos Indígenas”, no último abril indígena. O antigo “Dia do Índio” rendeu discussões profundas sobre o real significado da data, das homenagens, assim como do que deveria ser discutido nela, a começar pelo nome. Afinal, você sabe qual é a diferença entre “índio” e “indígena”? 

O termo índio, apesar de ainda estar presente no vocabulário de grande parte da população brasileira, é apontado como problemático por conta de sua generalização e contexto histórico.  A antropóloga, e coordenadora do Museu do Índio de Uberlândia, Lídia Maria Meirelles, comenta que a palavra é um equívoco histórico que se consolidou, mas que não é capaz de englobar a diversidade dos povos originários americanos. Um xavante é extremamente diferente de um guarani, não só pela origem geográfica, mas também pela cultura, idioma, crenças, e modos de vida.  

Essa é a razão para a proposta do uso da palavra indígena em seu lugar, que significa “aquele que estava aqui antes dos outros”. Os termos “originário” ou “nativo” também são utilizados, por representarem melhor a pluralidade existente na história de um país imenso como o Brasil. A proposta da mudança de nome do 19 de abril foi feita pela ex-deputada federal, e hoje Presidente da Funai, Joenia Wapichana; aprovado no Congresso Nacional e promulgado no Senado em 2022.

Em seu Instagram e no programa A voz do Brasil, a ex-deputada celebra a mudança do nome da data, e demonstra ter muito orgulho e boas expectativas para o futuro dos povos indígenas no Brasil. “Nunca mais um Brasil sem nós” foi o slogan usado pelo Governo Federal na campanha pelo Dia dos Povos Indígenas, que ganha força com as representações políticas que se consolidaram nos últimos anos; como a própria Joênia Wapichana na Funai, e Célia Xakriabá e Sônia Guajajara no Congresso, que compõe parte da maior bancada indígena da história do país. 

A UFU e o Museu do Índio 

O Museu do Índio da Universidade Federal de Uberlândia tem sua história iniciada em outubro de 1987, quando foi aberta a primeira exposição ao público. O espaço é extremamente rico no que diz respeito à cultura e à arte indígena, além de pesquisas e bibliografias de várias partes do Brasil, em especial o triângulo mineiro.  

Apesar de ser um Museu vinculado à Universidade, a maior parte do público do espaço são crianças e jovens em excursões escolares. Foto: Acervo Museu do Índio - UFU 

Em suas décadas de história, o Museu passou por transformações e expansões em seu acervo e eventos. Mesmo a pandemia do COVID-19 não impediu a continuidade do trabalho realizado pelo Museu, que chegou a oferecer um curso remoto de guarani para mais de 500 pessoas, entre brasileiros e estrangeiros. 

Além dos cursos e projetos ligados à universidade, a coordenadora do Museu fala da importância de museus etnográficos e de história natural para a educação básica. Em especial, o Museu do Índio da UFU recebe pessoas para além de Uberlândia, sendo um centro de cultura e conhecimento para todo o triângulo mineiro.  

O espaço está aberto para visitações de segunda à sexta, nos horários de 8 às 12h e 13:30 às 17:30h, além da possibilidade de visitas guiadas por agendamento prévio!

 

 

A educação e as culturas indígenas 

Em tese, o Dia dos Povos Indígenas existe para que a discussão e reflexão acerca dos direitos dos indígenas americanos, mas como isso pode ser feito? 

É muito comum a menção e “celebração” da data nas escolas de ensino fundamental e básico, onde muitas vezes as crianças têm seus rostos pintados, recebem penas na cabeça, e cantam músicas que falam de “índios”. 

Essa prática é considerada ofensiva por ser rasa e não ensinar muito para as crianças além dos estereótipos que as comunidades indígenas tanto tentam combater - além de tratar identidades e etnias como personagens e fantasias. Ailton Krenak, ativista e escritor das obras “A vida não é útil”, “O amanhã não está a venda” e “Ideias para adiar o fim do mundo”, no abril indígena de 2019, disse ao jornal Nexo “Enquanto houver gente no Brasil, vai ter presença indígena”. Por isso, a conscientização está sendo feita não só em abril, como em todo o ano, e em todos os espaços. 

Numa linha semelhante, está a noção de educação básica antirracista, que prega que é possível ensinar crianças o antirracismo e a representatividade. O mesmo vale para os povos originários. Lídia acredita que é possível fazer muito mais pela educação de nossas crianças, para que elas entendam, valorizem e protejam as pautas dos povos nativos do Brasil e, claro, para que crianças indígenas se vejam e sintam representados e ouvidos. Esse trabalho educacional, enquanto não se estabiliza nas redes de ensino tradicionais, é realizado por instituições como o Museu do Índio da UFU.